O ator ilheensee Fábio Lago chegou a Ilhéus na última quinta-feira, 10, com dois objetivos. Um deles foi comemorar o aniversário de 41 anos em companhia de sua família. O outro foi conversar com lideranças locais sobre o projeto do Complexo Intermodal Porto Sul.
Em uma reunião na sede do Sindicato dos Estivadores de Ilhéus, Lago ouviu diversas opiniões tanto sobre o Intermodal quanto acerca do terminal privativo da empresa Bahia Mineração. Particularmente, o artista inclina-se favoravelmente ao empreendimento, defendendo, porém, que ele seja implantado de uma forma que minimize os impactos ao meio ambiente.
Lago disse acreditar na importância dos investimentos que estão chegando a Ilhéus, como forma de dar novas perspectivas à comunidade local. Ele também pretende incentivar um projeto de reflorestamento em áreas degradadas da Mata Atlântica na região.

Há quem afirme que você esteja na contramão do que pensam os artistas da Rede Globo. Muitos já se posicionaram contrários ao Complexo Intermodal Porto Sul, alegando que o investimento traria sérios prejuízos às causas ambientais da região. Por que você decidiu defender o Complexo?
Primeiro não estou na contramão do que pensam os artistas da Rede Globo, porque não sei o que eles pensam, não parei para conversar sobre o Complexo Intermodal Porto Sul. E, segundo, te confesso que acho até normal que atores se engajem em campanhas que dizem respeito ao meio ambiente.  O que me incomodou ao ver a campanha, inclusive eu estava presente no dia que ela foi lançada, é que eles não conhecem profundamente a região em questão, nem o povo envolvido. Como sou filho apaixonado pela minha terra e sendo hoje o único artista que tem uma projeção em nível de imagem no contexto nacional, me senti na obrigação de pelo menos esclarecer o equívoco que a campanha “Porto Sul, não” representa.
Você deixa claro que não pretende ser um protagonista desta discussão, mas que será um ator importante no trabalho de consciência popular. Como você pretende se engajar nesta luta?
Quando digo que não quero ser um protagonista dessa discussão, tenho alguns motivos claros: Não sou ambientalista, não sou um político partidário, não sou técnico em construção de portos, rodovias e aeroportos, sou simplesmente um ator. Um ator popular. Além disso, tenho um dever como cidadão ilheense de me posicionar a respeito de um tema tão importante. Acredito numa nova cultura, numa cultura em que não há um único protagonista. No caso em questão, pretendo, com a minha popularidade, abrir os olhos (que estão fechados em alguns ilheenses) para uma das mais importantes oportunidades de crescimento, não só econômico e cultural, mas humano. Esse é meu maior interesse: o desenvolvimento do ser humano ilheense, elevando sua auto-estima e tentando criar uma consciência de que um indivíduo, mais outro indivíduo, mais um outro terceiro indivíduo, pode formar uma força agregadora que supera qualquer apatia do velho e caquético poder público. Mas para isso é preciso que a sociedade se organize e entenda que só existe um protagonista nessa história: ela mesma.
Achei, no caso da propaganda da Bamin, uma oportunidade incrível de investimento na minha região. Fazia pelo menos 25 anos que nada tão substancial acontecia por aqui.
Há algum tempo você apareceu numa propaganda da Bamin, uma das principais interessadas na consolidação deste projeto. Você não tem receio de te acusarem de estar a serviço da empresa?
Quando decidi ser ator eu tinha 16 anos, e o meu maior mestre, que se chamava Pedro Mattos, um dos maiores ativistas culturais que essa cidade já teve, era homossexual  e  não escondia isso de ninguém. Alguns amigos, alguns familiares e muita gente em Ilhéus torceu o nariz (preconceito puro) achando que eu era gay, porque eu fazia teatro com ele. Só tive o apoio, como sempre, da minha santa Mainha. Se tivesse parado para ouvir o que as pessoas pensavam de mim, eu não estaria aqui dando essa entrevista para você. Não me importo muito com o que as pessoas pensam sobre o que faço. Achei, no caso da propaganda da Bamin, uma oportunidade incrível de investimento na minha região. Fazia pelo menos 25 anos que nada tão substancial acontecia por aqui. Sou um ator. Faço teatro, cinema, TV e campanhas publicitárias em vários lugares do Brasil, mas essa campanha da Bamin era especial porque trazia a oportunidade de uma retomada da auto-estima do meu povo com os investimentos que a empresa prometia. Podia ser a Bamin, podia ser a Bavocê, Baeles, não me importava mesmo qual a empresa em questão. Sentia como artista, que deveria usar a minha imagem para me comunicar com meu povo, mesmo que ela sofresse críticas ou algum desgaste. Não me importo! O que me importa é essa discussão que estamos tendo agora, exercendo o que considero ser a maior conquista da nossa geração: a democracia. A Mata Atlântica nós podemos reflorestar.
O que você acha do movimento dos artistas contrários ao Porto Sul?
Acho um movimento perigoso e, ao mesmo tempo, necessário para essa discussão. Aprendi que, dependendo do ponto de vista, uma única árvore pode esconder uma floresta inteira. Você imagine alguém dizer para você que, num lugarzinho, ali no sul da Bahia, tem uma Mata Atlântica e uns corais que vão ser “destruídos” para construção de um porto que vai transportar minério de ferro. Talvez ouvindo uma afirmativa dessa, sem nenhum conhecimento de causa, cairia no mesmo erro e apoiaria um tipo de campanha como essa. Talvez se fosse para transportar passageiros para Itacaré e baía de Camamu, eles nem fossem contra, porque quando falaram em desmatar a mesma Mata Atlântica para fazer o Aeroporto Internacional de Ilhéus, não ouvi, nem li, nem vi nenhum ambientalista, nenhum artista de projeção nacional vestindo camisa, nem levantando a bandeira contra a construção de tal obra. Com isso, pretendo convidar os meus colegas e ambientalistas que encabeçam a campanha contra esse empreendimento, inclusive Caetano Veloso, que fez críticas ao Porto em sua coluna em um jornal, a virem conhecer a realidade da nossa região, ouvir o meu povo e debater sobre esse assunto aqui dentro da nossa terra, para que eles vejam a calamidade em que esse povo tão generoso se encontra, e ouvir a frase chocante de um jovem ilheense que me disse: “Estudar pra quê?”.
Serei a favor desse empreendimento e lutarei não só com unhas e dentes, mas com o coração e minha alma pelo nosso desenvolvimento humano.
Você acha que te diferencia deles o fato de ser daqui e conhecer como nenhum outro a realidade sócio-econômica da região?
Não tenho nenhuma dúvida disso. E até que meu povo me prove o contrário, serei a favor desse empreendimento e lutarei não só com unhas e dentes, mas com o coração e minha alma pelo nosso desenvolvimento humano.
Você tem um projeto de conscientização ambiental, de reflorestamento de áreas no sul da Bahia. Como pretende desenvolver esta sua proposta? E como engajar a sociedade nela?
É o que vim fazer aqui. Aglutinar. Encontrar atores que se comprometam junto comigo, com você, com toda sociedade para formalizarmos um projeto que visa o desenvolvimento humano. Tentando sensibilizar os empresários, o velho poder público, os líderes comunitários, estudantes, artistas e principalmente as crianças. O reflorestamento de áreas do sul da Bahia, limpeza de praias e manguezais, podem parecer apenas pequenas ações. Mas, meu amigo, eu aprendi a plantar uma árvore e te garanto, é estimulante e revitalizante. Espero que a sociedade entenda que é preciso o desenvolvimento, mas junto com esse vem a responsabilidade e comprometimento de cada cidadão.
A Rede Globo dá sinais bastante claros de que, talvez por interesse de alguns dos seus diretores, é contrária ao empreendimento. Aliás, é rotineiro matéria mostrando o lado negativo do Porto Sul. Você é funcionário da empresa. Não teme nenhum tipo de represália por estar contra ao que ela defende?
Não.
Não tenho interesse, nem autorização do meu povo para ser o defensor público número um de causa alguma. Ao contrário, quero ouvi-los.
Qual o sentimento de Fábio Lago, ilheense, ao abraçar esta causa?
Sentimento de responsabilidade com minha cidade e com o meu povo. Agora, quero deixar bem claro que não sou o único a defender essa causa. Não tenho interesse, nem autorização do meu povo para ser o defensor público número um de causa alguma. Ao contrário, quero ouvi-los. Porque se não for do interesse do povo ilheense o desenvolvimento, serei o primeiro a tirar o meu time de campo, com uma tristeza profunda no peito, mas respeitando o desejo da sociedade.
Que proposta você faria hoje aos artistas, colegas seus, para debater esse tema com mais profundidade e mais conhecimento sobre os dois lados da moeda?
Tive a impressão que alguns dos meus colegas de profissão que aderiram a campanha, não sabiam nem do que se tratava o projeto intermodal Porto Sul, pois, por acaso, estava presente no dia em que a campanha “Porto Sul, não”, foi lançada.  E eu questionei a um deles: Você conhece Ilhéus? A resposta foi clara: Não! Então, a proposta que faço é que venham debater sobre o tema e conhecer o povo mais acolhedor que eu conheço. O povo mais “boa praça” que eu conheço e muitas vezes, numa grande maioria, até apático. Esse último me incomoda profundamente. Acho que eles esqueceram de como eram corajosos e aguerridos nossos antepassados, quando expulsaram daqui os holandeses e os corsários franceses que queriam usurpar nossos bens e nossas riquezas. E é nessa força que estou apostando minha reputação, meu empenho e meu entusiasmo. Juntem-se a nós.
Essa é a maior ou talvez a última oportunidade de esperança de desenvolvimento humano que essa geração poderá ter nos próximos anos.
Em uma pequena frase, gostaria que você definisse o que representam estes investimentos para o povo daqui da região.
Quero deixar claro também que isso não será a salvação da lavoura, mas com o aumento da arrecadação, possivelmente surgirão novos empregos, aumentarão as perspectivas e auto-estima dos jovens, diminuirá a violência desenfreada, aumentará a qualidade de vida da população. Essa é a maior ou talvez a última oportunidade de esperança de desenvolvimento humano que essa geração poderá ter nos próximos anos.